Frei Clarêncio lança ‘Frei Bruno, Tudo para Todos’ no dia 13
Moacir Beggo
O livro “Frei Bruno Linden, tudo para todos”, escrito pelo presidente da Comissão Histórica do Processo de Beatificação e Canonização de Frei Bruno Linden, Frei Clarêncio Neotti, será lançado em Gaspar no dia 13 de novembro. O evento acontecerá no Salão Cristo Rei da Paróquia São Pedro Apóstolo às 20 horas.
Nesta entrevista, Frei Clarêncio conta como foi o processo para escrever esta biografia de Frei Bruno. Ele reside em Vila Velha (ES), onde é Vigário Paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo. Jornalista e escritor, atualmente edita e redige a revista “Vida Franciscana” e trabalhou na Editora Vozes de janeiro de 1966 a janeiro de 1986. Foi, durante todo esse tempo, redator da “Revista de Cultura Vozes”. É autor de “Ministério da Palavra” (3 volumes), “Santo Antônio, Mestre da Vida”, “Orar 15 dias com Santo Antônio”, “Santo Antônio: simpatia de Deus e simpatia dos homens”, “Santo Antônio, Luz do Mundo” (os 9 sermões do Padre Vieira sobre Santo Antônio, comentados), “Orar 15 dias com Frei Galvão”, “Comunicação e Igreja no Brasil”, “Imaculada Conceição de Maria”, “Frei Aurélio Stulzer, Pai, Irmão, Amigo”. Tem no prelo “Animais no altar”.
Frei Clarêncio, ordenado padre franciscano em janeiro de 1961, chegou a conhecer Frei Bruno, mas confessa que ao concluir sua biografia chegou a se surpreender com ele. “Como digo no livro, eu o conheci. Mas nunca convivi com ele. Me surpreendeu pelo retrato que emergiu dos Livros de Tombo, retrato que coincide com os depoimentos dos que o conheceram mais de perto”, revelou.
Frei Bruno recebeu a transferência para Gaspar em dezembro de 1902. Foi pároco em Gaspar até 1906, quando deixou a Paróquia nas mãos de Frei Dimas Wolf.
Site da Paróquia de Gaspar – Que balanço o sr. faz com a conclusão deste trabalho?
Frei Clarêncio Neotti – Quando, em fevereiro de 2012, em nome do Definitório, Frei Estêvão me convidou para escrever a biografia oficial de Frei Bruno e me disse que o convite vinha também em nome de Dom Mário Marquez, fui primeiro ao arquivo provincial ver o que havia sobre ele. Pouquíssima coisa. Nem mesmo os documentos essenciais, como batistério, profissão, ordenação lá encontrei. Não sou historiador, mas sempre tive faro histórico, que cresceu ao longo dos últimos anos pela experiência amorosa de escrever necrológios de Confrades. Esta experiência me ajudou muito. Saí à procura de folhetos, artigos e livretos publicados sobre ele. Vi que todos repetiam textualmente o belo necrológio escrito ainda em 1960 por Frei Edgar Loers, último guardião de Frei Bruno, em Joaçaba. Ora, nesse necrológio há imprecisões de datas e transferências, repetidas pelos copiadores. Em nenhum escrito sobre Frei Bruno encontrei, por exemplo, sua transferência de Gaspar para Petrópolis com o cargo de pároco em Cebolas. Isso me fez prestar muita atenção e checar com seriedade todas as informações correntes. Quando o livro estava em fase final, mandei os originais ao Padre José Artulino Besen, o historiador da Igreja em Santa Catarina que, por feliz acaso, é pároco em São José, sucessor, portanto de Frei Bruno. E também a Frei Ary E. Pintarelli, pedindo a ele um olho severo sobre a clareza do texto. Sou grato aos dois pelas correções e achegas.
Site – Quanto tempo de pesquisa demandou para fechar a linha do tempo de Frei Bruno?
Frei Clarêncio – Com a obediência do Definitório e a anuência compreensiva do meu guardião Frei Paulo Pereira, logo depois da Romaria de março de 2012, quando me encontrei com o Postulador Geral Frei Gianni, que me deu claras instruções de como fazer a coleta de dados, fui aos arquivos da Arquidiocese de Florianópolis, da diocese de Petrópolis, da diocese de Joinvile, da Casa Geral das Irmãs Catequistas, dos conventos de Rodeio e Xaxim. Fui aos arquivos das paróquias pastoreadas por Frei Bruno. Fotocopiei ou fotografei tudo o que encontrei. Antes de ir às paróquias de Não Me Toque, RS, e Xaxim, SC, passei pelo enfarto, que anulou muitos dias de possível trabalho. Quando, em outubro de 2013, foi constituído o Processo e eu fui oficialmente nomeado presidente da Comissão Histórica, eu já tinha recolhido os possíveis documentos em torno de Frei Bruno, sobretudo todos os Livros de Tombo escritos a mão por ele, alguns livros de Crônicas, quando ele foi o cronista da casa, e muitas cartas dele. A essa altura eu tinha lido tudo o que encontrara sobre as paróquias e Fraternidades onde ele trabalhara nas Vita Franciscana (em alemão, desde 1923 até 1942) e Vida Franciscana (desde 1942), as Crônicas de Frei Cleto Espey (em alemão), de Frei Pedro Sinzig (em alemão), de Frei Estanislau Schaette (em português). Vi, então, que havia farto material, com algumas lacunas, é verdade, mas suficiente para escrever a biografia de Frei Bruno dentro da Igreja e da sociedade de seu tempo. Escolhi como método a sequência temporal dos fatos. E percebi logo que os podia basear nos Tombos escritos por ele e nas Crônicas das Fraternidades. Em momento nenhum me esqueci de que a biografia era dirigida ao povo devoto. Por isso mesmo, procurei trabalhar com uma linguagem linear, de frases curtas. Daí também o acréscimo de uma centena de rodapés, ora para explicar ao povo o jargão religioso-curial, ora para pôr o leitor dentro da história da igreja local ou do município. Não podemos esquecer que Frei Bruno é da geração pioneira em todas as paróquias em que trabalhou. Estou de fato feliz de ter terminado esta biografia, item necessário para o processo de Beatificação e Canonização de Frei Bruno.
Site – Hoje, depois deste trabalho de pesquisa, como o sr. define Frei Bruno?
Frei Clarêncio – Frei Bruno me surpreendeu. Como digo no livro, eu o conheci. Mas nunca convivi com ele. Me surpreendeu pelo retrato que emergiu dos Livros de Tombo, retrato que coincide com os depoimentos dos que o conheceram mais de perto. Tive a ousadia de tentar fazer-lhe o retrato psicológico-espiritual-pastoral através de substantivos que ressaltam dos depoimentos. No livro aparecem apenas alguns depoimentos ou partes deles. No processo teremos a íntegra dos depoimentos, a íntegra das cartas que conseguimos, a íntegra dos Livros de Tombo e das Crônicas. Foi só no fim, quando o livro estava pronto, que fixei o subtítulo, uma expressão de São Paulo, “Tudo para todos”. Mas eu tinha posto numa folha à parte outros possíveis subtítulos, como: “O santo das famílias”, “O homem da misericórdia e da penitência”, “Quando bondade e bênção se encontram”, “O homem do bom senso”, “Deus olhou para a humildade de seu servo”. De fato, a família foi a maior preocupação pastoral de Frei Bruno. Num tempo de crise acentuada da família, como é o atual, o carinho pessoal e personalizado de um Frei Bruno talvez fosse a melhor medicina para o equilíbrio caseiro.
Site – O que mais te impressiona na vida dele?
Frei Clarêncio – Vou usar uma palavra desconhecida do mundo moderno. Impressiona-me Frei Bruno como asceta. Que pode ser sinônimo de penitente. Que pode ser sinônimo de disciplinado. Que pode ser sinônimo de congruente. Que pode ser sinônimo de rígido consigo e compreensivo com os outros. Que pode ser sinônimo de obediente sem glosa, mas com acentuado bom senso. Me impressionou muito o fato de nunca ter uma palavra negativa sobre confrades ou fatos acontecidos e por ele anotados nos Tombos e nas Crônicas. Também me impressionou seu conhecido desapego no vestir, no comer, no direito à sua vontade própria e no fato de ter renunciado por escrito ao direito de visitar seus parentes na Alemanha.
Site – Como falar de Frei Bruno para o mundo de hoje?
Frei Clarêncio – Se Frei Bruno fosse pároco em 2014, com seu modo de agir e sua visão de igreja e do mundo, estaria inteiramente deslocado. Como estaria qualquer santo canonizado. Os dons do Espírito Santo e as virtudes todas têm expressões diferentes na vida prática de cada tempo. Os dons são os mesmos. As virtudes são as mesmas. Mas o ambiente está inteiramente mudado. A grandeza humana de Frei Bruno está no fato de ele ter-se adaptado a paróquias rurais ainda em formação. A grandeza pastoral de Frei Bruno está no fato de ele ter levado àquele povo pioneiro e pobre o senso da fé e da piedade, o senso do amor fraterno e da comunidade, num jeito que todos compreendiam e, sobretudo, mostrando-lhes que ele vivia pessoalmente o que lhes ensinava. Muitos de nós não sabemos como levar ao povo de hoje o mesmo senso da fé e da piedade, o senso do amor fraterno e da comunidade. Falta-nos a adaptação e a congruência e nisto bem que Frei Bruno é mestre.
Site – Frei Bruno e Frei Galvão são frades que viveram em épocas distintas. Há aspectos comuns e diferenças. Quais o sr. aponta?
Frei Clarêncio – Cem ou cento e cinquenta anos separam os dois santos confrades. Tempos e lugares bem diferentes. Talvez Frei Galvão tenha vivido num tempo vocacionalmente mais difícil. Talvez Frei Bruno tenha vivido num tempo de maior liberdade e clareza pastoral. Mas os dois foram pastores de seu tempo. Os dois encarnaram, cada um em seu tempo, o carisma franciscano. Os dois foram visitadores assíduos das famílias. Os dois foram pacificadores, sobretudo de famílias brigadas. Os dois foram incansáveis confessores e prudentes conselheiros. Os dois passaram à história como homens de grande caridade e por causa da caridade até se bilocaram. Os dois foram homens de extrema confiança na Providência Divina. Os dois foram modelos de obediência sem tergiversação. Os dois foram conhecidos em vida por seu bom senso no julgamento e na tomada de decisões. Os dois eram conhecidos pelo povo como pessoas de muita oração e penitência. Os dois, ainda que muito observantes da clausura, eram incansáveis andantes a pé. Os dois, ordenados cedo, passaram dos 80 anos. Acrescentemos ainda que os dois são considerados pais de congregação feminina dedicada à catequese e ao ensino.
Site – O que representa para a Província este processo de beatificação?
Frei Clarêncio – Penso que em primeiro lugar é um dever de justiça para com toda uma geração de missionários franciscanos alemães, muitos deles mortos em fama de santidade e rodeados do carinho agradecido do povo. Pelo que sei, vários deles podiam ir para o altar com Frei Bruno. Lembraria Frei Januário Bauer, Frei Lucínio Korte, Frei Plácido Rohlf, Frei Rogério Neuhaus, Frei Solano Schmitt, Frei Zeno Wallbröhl, Frei Modesto Blöink, Frei Luís Reinke, Frei Policarpo Schuhen, Frei Domingos Schmitz, Frei Heriberto Behr, esquecendo outros mais novos.
Em segundo lugar, devemos reconhecer que a Província restaurada não fez grandes esforços em beatificar seus filhos. Frei Bruno foi um clamor do povo. Bendito clamor!
Em terceiro lugar, sempre a meu modo de ver, o processo de beatificação de Frei Bruno, que por 19 anos foi modelo do noviciado, pode significar um novo amanhecer vocacional ao lado de um profundo e sério agradecimento a Deus pelo nosso passado.
Em quarto, mas não último lugar, a beatificação de Frei Bruno poderá ou deverá rejuvenescer, aquecer e fortificar nossos compromissos com o carisma franciscano vivido em benefício do povo, sempre em estreitíssimos laços com a Igreja local.
Site – Quantas biografias o sr. já escreveu?
Frei Clarêncio – Se Você estiver pensando nos necrológios que publiquei na Vida Franciscana, acho até que já bati, e de longe, o recorde de eulogista de toda a Ordem. O necrológio do Frei José Luiz Prim, na minha contabilidade, leva o número 186. Escrevi também, a pedido insistente dos paroquianos de Vila Velha, uma biografia de Frei Aurélio Stulzer, que subtitulei “Pai, Irmão, Amigo” e que tem 170 páginas.