Frei Beppi celebra 50 anos de sacerdócio
Por Moacir Beggo
No dia 16 de dezembro, às 10 horas, Frei José Bertoldi estará celebrando o jubileu de 50 anos de sacerdócio com a comunidade paroquial de São Pedro Apóstolo. Frei Beppi, como é conhecido carinhosamente, vai celebrar antes, no dia 8 de dezembro, em São Paulo, com todos os jubilandos da Província da Imaculada Conceição do Brasil. Ele foi ordenado presbítero no dia 15 de dezembro de 1962.
Em 58 anos de caminhada na vida religiosa franciscana, o catarinense Frei José Bertoldi acumulou muitas milhas, tanto em território brasileiro como no exterior. Residindo, agora, na Fraternidade de Gaspar, Frei Bertoldi faz jus ao carinhoso apelido de Frei Beppi, dado pelos seus confrades. Afável, atencioso com os paroquianos, ele dá mostras de que está muito à vontade na nova fraternidade, como sempre foi a sua marca registrada em todas as residências franciscanas.
Frei Beppi nasceu em Ascurra (SC), uma cidade com cultura predominantemente italiana, em 22 de fevereiro de 1935. Hoje, com 77 anos, ri muito quando um bispo brincou dizendo que ele era emérito [é um título conferido a um bispo diocesano cuja renúncia foi aceita após 75 anos]. Em 2010, comemorou o jubileu de 50 anos de vida sacerdotal, mas nos passos de São Francisco de Assis já está há 58 anos, embora ingressou no seminário menor para cursar o ensino fundamental, quando ainda havia Seminário em Rodeio.
Nesta entrevista, Frei Beppi enumerou todas as 20 fraternidades onde esteve e confessa que nada deu mais satisfação do que trabalhar nos santuários e ser capelão no Hospital Santa Catarina (SP).
Para ele, é muito gratificante dar o atendimento espiritual a um fiel que vem de longe se confessar num santuário ou confortar um doente no hospital. “Eles esperam isso de nós, frades”. Frei José vestiu o hábito de São Francisco em 22 de dezembro de 1956. Fez a profissão solene no dia 23 de dezembro de 1960.
Em 58 anos de vida religiosa, o Sr.passou por muitas fraternidades?
Frei Beppi – Sim, foram 20. Comecei na Vila Clementino (SP), vamos dizer assim, meu primeiro amor. Depois fui para o Rio de Janeiro, em Nilópolis, onde fiquei quatro anos; ali naquele estado eu continuei subindo a serra para Petrópolis, onde era para participar de uma projeto-piloto de paróquia. Mas acabou não dando certo e fui transferido para Joaçaba (SC). Em 74, fui eleito definidor e também era guardião e pároco em Rodeio (SC). Só que ao terminar o mandato de definidor em 77, tive um enfarte. Depois pedi para fazer uma experiência na Diocese de São Francisco do Sul, mas fiquei somente um ano. Fui para o Mato Grosso do Sul, onde estive como missionário em Dourados e Rio Brilhante. Voltei para o Sul em seguida e fui parar em Garuva, na divisa de Paraná com Santa Catarina. Fiz novamente uma experiência de padre secular. Era para ficar três anos, mas voltei depois de 2 anos. Não aguentei ficar muito tempo fora da Ordem. Voltei para Garuva e depois fui transferido para Ituporanga, onde fiquei 3 anos. Dali fui para Agudos, onde fiquei 5 anos. Quando houve a inauguração do Eremitério, em Rodeio, me candidatei para formar a primeira fraternidade. Foi uma experiência bem diferente, onde no alto da serra de Rodeio não tínhamos comunicação com a superfície através de telefone e nem tínhamos carro. Ou seja, vivemos um período como reclusos mesmo. Dali, passei por Angelina (SC) e depois viajei para a Terra Santa, onde fiquei de 96 a 2001. Na volta ao Brasil, fiquei em Petrópolis, Curitiba e São Paulo, no Convento São Francisco, onde fui capelão do Hospital Santa Catarina. Dali fui transferido para Rondinha e, por último, para Gaspar em fevereiro do ano passado.
Nesse tempo, o sr. fez experiências diferentes, como no exterior, em santuários, em eremitérios e dioceses?
Frei Beppi – Sim, foi uma boa experiência. A vida secular é interessante, mas senti falta dos confrades e da vida em fraternidade. De todas, contudo, o que mais gostei foi trabalhar nos santuários, como em Curitiba, no Bom Jesus dos Perdões, e em São Paulo, no São Francisco. Gosto de fazer esse atendimento, aconselhamento e confissões. É onde me sinto mais sacerdote. A grande maioria das pessoas vem de lugares distantes porque sabe que haverá um padre no santuário para atendê-las, seja numa confissão ou numa orientação. É gratificante você ver pessoas que chegam chorando e saem sorrindo. Isso, particularmente, me dá muita alegria. Num santuário, em grandes centros urbanos, você atende pessoas simples e cultas. Numa homilia, tem que saber falar de forma simples e profunda para atender a todos.
O sr. sempre foi assim calmo, afável com as pessoas?
Frei Beppi – Nunca procuro litigar com uma pessoa. Já recebi ‘patadas’ de frades que não gostavam de certas atitudes, mas ficava quieto e, no dia seguinte, agia como se nada tivesse acontecido. Isso desmontava as pessoas.
Qual o segredo para ter 58 anos de vida religiosa?
Frei Beppi – Tenha muita paciência, seja compreensivo e humilde. Você vai precisar disso na sua caminhada, especialmente na vida fraterna.
Em 58 anos, o sr. teve momentos de dúvidas?
Frei Beppi – Quando cursava Filosofia, enfrentei uma crise a ponto de pedir para ir embora. Frei Otávio Schneider era meu mestre e ele disse: ‘é bom saber’ que depois da Filosofia vem a Teologia e você vai superar essa dúvida. Realmente, superei. A gente tem que aceitar que somos humanos e não anjos. Não temos uma fórmula infalível. As dúvidas vão aparecer para qualquer pessoa.
Como nasceu a sua vocação?
Frei Beppi – Desde criança gostava de ser padre. Tanto que ‘se vestia’ com o capote do meu pai e celebrava missa. Era a minha batina. O vinho era uma taça de leite e o pão era uma banana picada. E as minhas irmãs tinham de ficar atrás de mim rezando. E ai se não rezassem… Desde pequeno queria ser padre. Nasci numa paróquia salesiana em Ascurra, mas com 10 anos, minha família se mudou para Diamante, um distrito de Rodeio. Naquele tempo, havia a tal da comunhão solene, que consistia na segunda comunhão depois de aprofundar o catecismo. Então, estava estudando o catecismo em Rodeio, naquela casa do café, onde hoje é a capela mortuária. Naquele tempo tinha de tomar a comunhão em jejum e o pessoal saia da igreja e ia lá tomar café. Mas no meu tempo já não se servia café e a sala era da catequese. Do outro lado, estava o Seminário Nossa Senhora de Fátima. Um dia, observava os seminaristas trabalharem e Frei Querubim (Engel) me olhava da janela. Foi, então, que ele deu a volta e veio falar comigo. E me perguntou: “Você está gostando do que fazem esses meninos?” Respondi: “Sim”. Ele disse: “Você não gostaria de ser como eles?” Respondi: “Gostaria, mas a mamãe não deixa”. Isso porque minha mãe era viúva e era o filho mais velho de quatro irmãos. Ela precisava de um braço forte. Frei Querubim disse: “Chame a mamãe e venha falar comigo”. E ela foi lá. Ele conversou com ela, que chorou na hora, mas na outra semana já estava com o saco de roupas nas costas, ingressando no Seminário. Naquele tempo, o seminário era uma espécie de preparatório para o ginásio ou ensino funtamental. O ginásio era feito no Seminário de Rio Negro e o Colegial em Agudos.
Valeu a pena essa caminhada de 58 anos?
Frei Beppi – Faria tudo de novo. Há momentos que marcam a gente. Em São Paulo, num atendimento no Hospital Santa Catarina, um jovem se aproximou de mim e disse que gostaria de ser como eu. Por isso, a importância do testemunho dos frades. Não adianta falar bonito e não dar testemunho. É como um címbalo que está vazio. Há problemas na vida fraterna, sim, mas eu tenho que ver que estou aqui por causa de São Francisco de Assis e não de um frade. Não podemos perder a nossa referência.
O que o sr. diria a um jovem que está ingressando na vida religiosa?
Frei Beppi – Em primeiro lugar para se convencer de que realmente é esta a vocação que quer seguir. Depois de fazer uma opção segura, dar o melhor de si naquilo que a fraternidade e a ação pastoral pedem. Por exemplo, colocar o irmão acima de uma vontade própria, tendo que sacrificar a sua folga para dar atendimento a um doente. Abrace o ideal franciscano. Hoje, ele está atualizado nas Constituições. Não como um instrumento legalista, mas como uma ajuda para viver como franciscano hoje. Se vivo como franciscano, vou ser exemplo para os mais jovens.
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